A escola que está virando um jardim

Reproduzimos abaixo artigo de Gilberto Dimenstein, publicado no Portal Aprendiz, sobre uma experiência de solidariedade, responsabilidade, cidadania e persistência de um grupo de alunos, professores e vizinhos e que resultou na mudança para melhor de uma escola pública. Boa leitura!

Por Gilberto Dimenstein
O jardineiro Afonso Batella sonhava em ter um jardim que fosse uma espécie de laboratório a céu aberto, onde pudesse cultivar as mais diferentes árvores, compondo um jogo de formas, cores e aromas. Queria em volta crianças e adolescentes dispostos a aprender botânica e a produzir mudas a serem espalhadas pela cidade. Neste ano, ele descobriu o local ideal para realizar esse sonho: uma escola pública, perto de sua casa, com amplo espaço para plantio. "Resolvi dedicar parte da minha vida a esse projeto."

Há pouco tempo, porém, o lugar nada tinha de ideal. Não passava de um solo infértil, tanto que já tinha data para fechar. Havia sinais de deterioração por todos os lados: salas vazias, cenas cotidianas de violência, professores desanimados.

A melhora dos resultados do Brasil, exibidos na semana passada pelo Pisa (Programa Internacional de Avaliação de Alunos) -um ranking mundial da qualidade de ensino-, depende, em parte, das lições que se tiram desse jardim-laboratório.

A escola se chama Carlos Maximiliano e já estaria fechada no final de 2007 não fosse a resistência de um punhado de alunos e professores. Era difícil achar um diretor para a escola, tantos eram os problemas.

A comunidade da Vila Madalena e do entorno decidiu apoiar. O Colégio Santa Cruz enviou alunos para dar aulas, o Colégio Porto Seguro ajudou na reforma do auditório, que virou um teatro, o COC deu reforço em português e matemática. Uma empresa de publicidade (a 141 Soho) entrou com verbas para pintura e pequenas reformas. O Centro Paula Souza ocupou um dos andares com cursos técnicos de informática, administração e marketing.

Surgiram grupos voluntários para dar oficinas de dança, literatura, música, teatro, cinema e comunicação. Nesta semana, a BrasilPrev está recebendo um prêmio do Banco do Brasil por sua parceria com o Maximiliano, onde desenvolveu o programa "Escola do Bairro".

Vendo o esforço, a Secretaria da Educação convidou, no ano passado, um diretor (Antônio Roberto Ramos) e um coordenador pedagógico (Marcelo Clementino) com um histórico de parcerias com escolas públicas. A abertura reforçou ainda mais as parcerias -foi aí que o jardineiro encontrou receptividade. Em frente à escola, há um prédio com muitos psicólogos e psicanalistas, que decidiram também ajudar.

O teatro passou a receber diariamente eventos de música, dança, teatro, literatura, todos abertos à comunidade. Um projeto tão improvável como o jardim-laboratório ganhou vida. O que se vê ali é um encontro de gente com ideias inovadoras, conectadas em escala planetária -uma versão Vila Madalena do TED (Tecnologia, Design e Entretenimento), núcleo criado na Califórnia para disseminar ideias pioneiras. O fato de o encontro ocorrer numa escola pública com aquele histórico virou conversa mundial entre as pessoas envolvidas no TED.

Essa movimentação levou o caso, documentado pela Fundação Paulo Vanzolini, da Poli, a ser usado em cursos de gestão escolar como exemplo de comunidade que atua no incremento da educação pública.

A escola antes condenada passou a atrair alunos da rede privada.

As razões dessa mudança do Max podiam ser entendidas na exposição, na semana passada, de uma das mais interessantes experiências sociais brasileiras. Um grupo de empresários e executivos (Parceiros da Educação) vem apoiando escolas públicas para aprimorar sua gestão. A melhora das notas é generalizada, mas é mais expressiva ainda nos locais com determinadas características. A primeira delas: a eficiência do diretor. A segunda: o envolvimento dos pais e da comunidade.

O movimento experimentou e agora está disseminando a invenção do professor comunitário.

Entramos no próximo ano com a crescente convicção de que educar é algo muito complexo para ficar apenas dentro dos muros da escola. É por isso que, num terreno infértil, pode nascer um jardim.

PS - Uma das experiências mais polêmicas da atualidade em educação são as chamadas escolas "charter", desenvolvidas nos Estados Unidos. A escola pública é gerida, com autonomia, por associações comunitárias, cujo contrato depende do desempenho dos alunos. Acaba de sair um relato em português sobre a experiência, produzido pelo Instituto Fernand Braudel em parceria com a Fundação Itaú Social. Para quem se interessa pelo ensino, é leitura obrigatória. O estudo pode ser baixado na íntegra do meu site (http://www.dimenstein.com.br/).

Fonte: Portal Aprendiz

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