Tese da USP conclui que visões tradicionais permanecem na imagem da mulher em HQs

Personagens mulheres em histórias em quadrinhos têm que conviver com visões tradicionais a respeito do feminino e a influência do machismo em suas vidas. Esses dilemas estão presentes em trabalhos feitos por artistas homens ou mulheres, como constatado pela doutora em comunicação Ediliane de Oliveira Boff. Segundo ela, “a simples presença de mulheres em um campo de trabalho ou artístico não necessariamente significa mudanças nas visões sobre o feminino”.
Em sua tese de doutorado defendida na Escola de Comunicações e Artes (ECA) da USP, Ediliane estudou a representação da mulher em histórias em quadrinhos de vários gêneros, como humor, erotismo, autobiografia e historietas sentimentales(gênero desenvolvido na Espanha e que foi dedicado ao público feminino).
Além de discutir as maneiras como o feminino é representado e produzido nas histórias em quadrinhos, a pesquisa também teve como objetivo comparar as formas de representação feminina de artistas homens e artistas mulheres, problematizar os limites do gênero e analisar as modificações e permanências nos modos como as mulheres são representadas nas histórias em quadrinhos.
A principal motivação da pesquisadora para estudar o tema foi perceber uma carência de protagonistas femininas relevantes nas histórias em quadrinhos e a falta de visibilidade de artistas mulheres no ramo.
Diferença entre artistas
A pesquisadora estava munida de uma hipótese durante a pesquisa. Segundo ela, esperava encontrar dois extremos de representação da mulher: a Maria — que representa pureza, inocência, virgindade, delicadeza, etc — e a Madalena — que seria o extremo oposto. Essas imagens realmente apareceram entre os resultados, porém ela também percebeu que as personagens femininas representam mais que isso.
“Em grande parte essas personagens dialogam com concepções machistas a respeito delas mesmas. Assim, essas protagonistas estão constantemente discutindo como o machismo influencia em suas vidas. Essa influência acontece nas relações de trabalho, relações amorosas e sexuais, de amizade, etc.”, explica Ediliane.
Algumas visões tradicionais a respeito do feminino foram encontradas tanto em trabalhos de artistas homens quanto em artistas mulheres. Mesmo as visões transgressoras podem partir de artistas de ambos os gêneros. “Essa constatação coincide com a ideia de que a simples presença de mulheres em um campo de trabalho ou artístico não necessariamente significa mudanças nas visões sobre o feminino. A simples presença não basta para que um cenário masculinista se modifique, por exemplo”, conclui a pesquisadora.
Desenvolvimento
A pesquisa foi dividida em dois momentos diferentes. “O primeiro abordou algumas protagonistas femininas de quadrinhos a partir da produção de artistas homens. E o segundo abordou algumas protagonistas femininas de quadrinhos a partir da produção de artistas mulheres. Nesse segundo bloco, a pesquisa ainda abordou algumas tiras de Laerte, que discute os limites da representação de gênero, a partir da personagem Muriel, uma mulher transgênera”, relata.
A escolha dos títulos foi baseada nessa divisão e os critérios de escolha variaram dentro desses dois momentos. Para a primeira etapa, foram consideradas histórias que realizassem uma discussão sobre o gênero feminino ou que fizessem uma representação do corpo feminino e seu aspecto sexual.
Já para o segundo momento da análise os quadrinhos escolhidos também deveriam conter uma discussão sobre o gênero feminino. No entanto, para esse momento foi considerada a atuação política ou feminista da artista. Na primeira parte foi considerada a relevância da personagem e na segunda, da artista no cenário internacional e doméstico de quadrinhos.
Foram analisados vários títulos, entre eles “Mulher de 30″, da quadrinista Cibele Santos, “Amely: uma mulher de verdade”, de Pryscila Vieira, “Uma Patada com Carinho”, de Chiquinha, Muriel, de Laerte, e “Esther”, desenhada por Purita Campos.
Segundo a pesquisadora, no momento de reunir material para pesquisa, entre 2010 e 2011, foi encontrada uma carência de artistas mulheres no ramo dos quadrinhos. No entanto, esse cenário já está um pouco diferente no momento.
Parte da pesquisa também foi realizada na Espanha, onde foram feitas entrevistas com artistas que apresentaram ampla consciência de suas condições femininas e relataram situações de preconceito vividas por elas. Aqui no Brasil, a artista Pryscila Vieira — criadora da personagem “Amely: uma mulher de verdade” — foi escolhida para uma entrevista.
A tese de doutorado De Maria a Madalena: representações femininas nas histórias em quadrinhos foi orientada pelo professor Waldomiro de Castro Santos Vergueiro. Ela contribui para criação de consciência sobre a representação do gênero nos meios de comunicação. “Essa consciência sobre como somos representadas é de fundamental importância para que seja possível contribuir com uma sociedade mais justa e igualitária no âmbito do gênero”, avalia.
Fonte: Agência USP/ Texto: Rúvila Magalhães Foto: Marcos Santos / USP Imagens 06/05/2014 (http://www.usp.br/agen/?p=175874)

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