País não tem indicador de alfabetização

Garantir o direito da alfabetização na idade correta a todas as crianças é um grande passo para o sucesso escolar. Para verificar e acompanhar esse direito, são necessários dois indicadores: o primeiro para verificar se a conclusão da 2ª série/3º ano está ocorrendo na idade correta; e o segundo para medir a qualidade dessa alfabetização. O primeiro pode ser obtido a partir das PNADs – mas, para o segundo, ainda não há um indicador nacional para mensurar a qualidade da alfabetização. Para falar sobre esse importante tema, o movimento Todos Pela Educação entrevista Ruben Klein, especialista em avaliação e consultor da Cesgranrio. Para ele, o Brasil perdeu este ano uma grande chance de incorporar ao Saeb/Prova Brasil uma avaliação da alfabetização dos alunos da 2ª série/3º ano do Ensino Fundamental.

Durante a entrevista, Klein explica como seria a construção de um indicador para o acompanhamento da Meta 2 e por que a Provinha Brasil não pode ser considerada uma avaliação externa. O Ensino Fundamental de 9 anos e o atraso escolar nas séries iniciais estão entre os assuntos analisados pelo especialista, que também é sócio-fundador e membro da Comissão Técnica do movimento Todos Pela Educação.

Todos Pela Educação - Qual é a importância da Meta 2 do movimento Todos Pela Educação?
Ruben Klein - O cumprimento da Meta 2 é fundamental para o cumprimento da Meta 4 – todo jovem de 19 anos com Ensino Médio concluído –, isso porque atrasos nessa
fase inicial do aprendizado são difíceis de recuperar. Da mesma maneira, se a parte de qualidade da Meta 2 não tiver sido cumprida, dificilmente a Meta 3 – todo aluno com aprendizado adequado à sua série – será alcançada. A Meta 2 requer um fluxo escolar correto: toda criança entrando na escola na idade correta (6 anos no 1º ano do Ensino Fundamental) ou adiantada e um ensino de qualidade que permita que os alunos passem de ano e garanta que toda criança saiba ler, escrever e entender textos simples. Em nossa opinião, toda criança deve ter também domínio de algumas habilidades matemáticas. Observamos que essa meta requer que não haja retenções de alunos nas séries iniciais.

Todos Pela Educação - A Provinha Brasil não pode ser considerada uma avaliação externa e um instrumento de controle social do processo de alfabetização no país, como são o Saeb e a Prova Brasil?
Ruben Klein - Na Provinha Brasil, o INEP/MEC disponibiliza, no início e no fi nal do ano, um teste de múltipla escolha em leitura para que cada escola ou secretaria estadual/municipal aplique, voluntariamente, aos alunos da 1ª série/2º ano do Ensino Fundamental. Embora avalie a capacidade de ler e escrever, o teste não mede a escrita, pois não tem questões dissertativas ou espaço dedicado à redação. A Provinha Brasil pode ser útil para as redes e os professores avaliarem seus alunos como um instrumento pedagógico, mas não é uma avaliação externa, pois não é aplicada e corrigida externamente com a garantia de critérios de padronização de aplicação e de correção.
Para ser viável, uma meta precisa ser definida através de indicadores que possam ser acompanhados ao longo dos anos e comparados com o objetivo final. O uso da PNAD
para o indicador de conclusão na idade correta satisfaz esse critério. Para avaliar a qualidade, é necessário ampliar o Saeb/Prova Brasil com testes de Língua Portuguesa e Matemática aplicados universalmente ou em amostras na 2ª série/3º ano e cujos resultados sejam apresentados na escala do Saeb. Isso é muito desejável para poder comparar os resultados com os das outras séries. Os resultados da Provinha Brasil não estão na escala do Saeb: sua aplicação não é universal, nem amostral. Por isso, não é possível, a partir da Provinha Brasil, definir indicadores para acompanhar a
evolução da Meta 2 no País.

Todos Pela Educação – Então, em sua análise, como deveria ser uma avaliação nacional que permitisse à sociedade acompanhar se o processo de alfabetização das crianças está sendo realizado na idade correta?
Ruben Klein - Para medir a parte da qualidade da Meta 2, é preciso expandir as escalas de Língua Portuguesa (Leitura) e de Matemática do Saeb/Prova Brasil para a 2ª série/3º ano do Ensino Fundamental. Isso pode ser feito sem problemas, e já ocorre em algumas avaliações estaduais e municipais. É uma pena que o INEP/MEC tenha perdido a chance de introduzir essa série/ano na realização do Saeb/Prova Brasil no ano de 2009. Isso poderia ter sido feito, inicialmente, somente em uma amostra, como no Saeb. De qualquer maneira, fica a demanda para que esses acréscimos sejam incluídos no Saeb/Prova Brasil de 2011. Quanto à parte do fluxo escolar, idade correta, pode-se medir o percentual de conclusão da 2ª série/3º ano na idade correta de 9 anos.

Todos Pela Educação - Como seria essa avaliação?
Ruben Klein - É importante ressaltar que na aplicação desse teste para a 2ª série/3º ano, os mesmos critérios de aplicação da 4ª série/5º ano, sem nenhuma leitura por parte do aplicador, devem ser mantidos. Feita a ampliação da interpretação das escalas do Saeb, únicas por disciplina, poderiam ser defi nidas metas de qualidade, como ocorre na Meta 3 para Língua Portuguesa/Leitura e para Matemática.

Na alfabetização, é importante medir também a parte de escrita. Para isso, é necessário incluir uma parte de questões com respostas construídas, que talvez possa ser incorporada à escala de Língua Portuguesa ou que exija a criação de uma escala separada de escrita, além de uma redação. Isso também poderia ter sido introduzido no Saeb/Prova Brasil desse ano.

Todos Pela Educação - Como o senhor avalia a ampliação do Ensino Fundamental para 9 anos?
Ruben Klein - No ano passado lembramos que existia o perigo de a introdução do Ensino Fundamental de 9 anos acarretar aumento do atraso escolar, pois a nova série poderia reter alunos e também atrair alunos novos de 7 anos para o 1º ano. Isso aconteceu com a introdução da Classe de Alfabetização (CA) em algumas redes estaduais a partir de 1985, como, por exemplo, nas redes de ensino do Rio de Janeiro. Agora temos evidência de que isso está, de fato, ocorrendo.
Uma análise de fl uxo, a partir dos dados divulgados pelo INEP/MEC*, mostra uma queda considerável no número de alunos novos na 1ª série/2º ano. Esse número deveria ser da ordem de 3,4 milhões, número aproximado de crianças de 7 anos. No entanto, em 2008, esse número caiu para cerca de 2,85 milhões. Pela experiência anterior sobre as CAs, sabe-se que esse número retorna ao normal lentamente, mas que inclui muitos alunos com atraso escolar. Esse fato pode acarretar uma queda maior ainda nas taxas de conclusão da 2ª série/3º ano na idade correta.

Todos Pela Educação - Qual é o atraso escolar nessa faixa etária?
Ruben Klein - O atraso escolar na 1ª série/2º ano já é grande. Segundo as PNADs de 2007 e 2008, o percentual de crianças de 7 anos matriculadas na escola, mas que não atingiram a 1ª série/2º ano, esta em torno de 25%. Há ainda cerca de 2% de crianças de 7 anos fora da escola. É preciso ressaltar que a Meta 4 admite um ano de atraso para conclusão do Ensino Fundamental e/ou do Ensino Médio. A Meta 2, não.
Segundo o INEP/MEC*, na maioria dos estados das regiões Norte e Nordeste e nos estados de São Paulo e do Espírito Santo, ainda falta muito para acabar a implantação do Ensino Fundamental de 9 anos. Logo, é razoável supor que, sem nenhuma ação externa, o atraso escolar vai aumentar, e as taxas de conclusão cairão mais ainda.

Todos Pela Educação - O que pode ser feito para solucionar esse problema?
Ruben Klein – É necessário haver ações imediatas por parte dos governos e da sociedade para reverter essa situação. É preciso garantir que toda criança de 6 anos esteja matriculada no 1º ano do Ensino Fundamental de 9 anos, que deve estar plenamente implementado em 2010. Retenções ou repetências nessas séries iniciais só devem ocorrer em casos extremos.


Fonte: Todos pela Educação (09/12)

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